Rodrigo Ramazzini(*)
- Seu Dionísio sente-se, por favor, pois a notícia que lhe darei não é das melhores. O seu filho Joaquim acidentou-se em sua cavalgada. Foi socorrido, levado ao hospital, mas não resistiu aos ferimentos originados pela patada do animal...
Não somos preparados para surpresas, muito menos negativas. Aprendemos que a vida tem um curso básico, de progressão, e qualquer interferência neste “roteiro” estabelecido passa pelo plano do imaginário. A morte repentina, como o exemplo mais completo, ainda mais se o finado for jovem.
Um falecimento bestial tendo em vista a lógica humana. Fora averiguar as ferraduras do cavalo. Mas por que verificar isto, meu Deus? E o animal assustara-se. O coice acertou-o bem ao peito. Sem chances para o jovem Joaquim.
Uma cidade sensibilizada. Pobre Joaquim, morrera tão moço, na flor da idade, um belo rapaz. A morte santifica. Família conhecida, uma multidão no velório a dar as suas condolências e pêsames. Os pais, revoltados, moribundos, a olhar o caixão. Não acreditam no epílogo reservado ao seu “fruto”.
A namorada do Joaquim, a Tahira, estava a trabalhar (era vendedora em uma loja) quando soube da funesta notícia. Desmaiou. Tinham uma relação complicada, de inúmeras idas e vindas. Brigavam seguidamente. Eram ambos “geniosos”, não davam o braço a torcer. O que lhes sustentava unidos, segundo Tahira, era o sexo. Ou o costume?
O ser humano é confiável? Na noite anterior ao acidente, Tahira e Joaquim discutiram feio. Uma “briga normal”, como as demais que já haviam tido. Joaquim pegou a sua moto e rumou para um bar, para beber um pouco. Tahira produziu-se toda, como toda mulher magoada e vingativa sabe fazer, e saiu também. Estava linda. Todos a olhavam. Encontrou algumas amigas. Bebeu bastante, e conheceu o Jéferson.
O beijo aconteceu em frente à sua casa, dentro do carro do Jéferson. Era a primeira vez que Tahira agia desta forma. Traição! Foi uma ação rápida. Quando começaram a se beijar, a mãe de Tahira espiou-os pela janela. Assustada, saltou do carro. Dormiu a pensar em seu ato. Impulso?
Acordara com uma sensação estranha, um pressentimento talvez. Mas como os reclames para ir trabalhar eram diários, tais percepções não lhe tomaram a atenção. O lúgubre aviso chegou por volta das 10h30min da manhã, através de uma prima do Joaquim. Era o fim!
Levada ao hospital local, medicada, dirigiu-se, então, ao velório com os seus pais. No carro, os seus pensamentos vertiginosamente transcorrem entre o questionar lúcido da moral e a saudade. O que é certo ou errado? Chegam ao local.
Sobem uma pequena inclinação do caminho até atingirem o exato lugar. Tahira caminha de cabeça baixa, amparada pelo pai. Na porta é recepcionada por uma tia do Joaquim, que a conduz até os pais dele. Uma esperada comoção marca esse encontro. Então, Tahira vira-se para o escuro caixão, respira fundo, e lembra-se do encantador sorriso de Joaquim, e descobre: ele era o seu verdadeiro amor.
O arrependimento! Uma lágrima escorre na sua morena face. Aproxima-se do caixão, e passando a mão no rosto de Joaquim, lhe indaga, baixinho: “Perdoa-me?” Abraça-o, e chora até a terra úmida encobrir toda a matéria, e tudo virar saudade. O adeus!
As lamúrias de Tahira sensibilizaram os presentes, sendo que geraram todos os comentários após o enterro...
Mal sabem que as lágrimas não eram apenas pela dor da perda, mas também, por causa da consciência... A consciência pesa!
(*) Jornalista e cronista
segunda-feira, 30 de junho de 2008
quinta-feira, 26 de junho de 2008
Medos e descobertas de Sofia, por Silvana Alves
O vento entra pela janela e as cortinas do quarto se agitam. Sofia acorda meio assustada com o barulho que o vento faz. Levanta-se para fechar a janela, mas ao olhar para fora do quarto vê no horizonte o nascer do sol e pensa no que tinha acontecido.
Na noite anterior tinha saído com alguns amigos da faculdade. Sofia cursava o 2º semestre de Direito e sempre teve ótimos relacionamentos com todos os alunos do curso e da faculdade. Queria como toda menina de 19 anos, se formar e ir embora da cidade aonde nascera e tinha sido criado.
Era filha única e seus pais sempre foram muito protetores. Quando passou no vestibular eles choraram de emoção e tristeza, porque a jovem menina de cabelos longos e pretos, partiria para uma cidade no interior de Minas Gerais.
A cidadezinha era pequena com apenas 50 mil habitantes todos praticamente se conheciam, era até perigoso falar mal de alguém, porque um poderia ser parente do outro e assim sucessivamente.
Mas naquela manhã, que Sofia foi acordada com o vento, ela estava trêmula e ansiosa. Na noite anterior saiu com um grupo de amigos da faculdade, aproximadamente 30, de vários cursos entre Agronomia, Comunicação, Direito e Medicina.
Ela era a mais jovem da turma e pode-se dizer a mais ingênua também. Desde criança sempre foi muito bonita, cabelo preto, longo pela cintura, olhos azuis que puxara de seus avós italianos, a pele parecia a de uma bonequinha de porcelana. Era baixa, apenas 1,60m, seu peso era compatível com seu tamanho.
Não gostava de praticar esportes. Sempre achou uma perda de tempo. Seus dotes eram naturais. Naquela noite, ao sair com os amigos, conheceu o jovem Beto, mais experiente que ela, tinha 25 anos e cursava o 8º período de Medicina.
Ele era natural da Capital de São Paulo, foi a primeira vez que se viram. Ao chegar, Sofia o avistou de longe e ficou encantada. Comentou com sua melhor amiga, Berenice:
- Bere, quem é aquele gato?
- Esquece não é pra você. Ele é um piranha!!! – exclamou Berenice
A amiga a alertou sobre o que poderia vir pela frente.
- Ah, diga quem é? – insistente, perguntou novamente
- Chama-se Beto, já pegou praticamente todas as meninas do Curso de Medicina. Ele faz residência no hospital da faculdade e da cidade. A cara de anjo engana, cuidado! – alertou Berenice.
Sem dar muita atenção ao que sua amiga falava, Sofia o admirava. Era alto, devia ter um 1,80m, tinha cabelos curtos e ajeitadinhos, seus olhos tinham cor de mel e sua boca carnuda chamava a atenção de todas as meninas. Todos sentados, bebendo, comendo, rindo. Sofia olhava-o sem parar. Sua amiga já havia lhe dado vários cutucões, mas ela exclamava:
- Ele é lindo! Vou beijá-lo!
- Amiga, ele não fica só nos beijos, cuidado. Você, além de nova, é ingênua – alertou Berenice.
Já passavam das 23h30, quando alguns começaram a se despedir. Afinal, no dia seguinte, sábado, alguns teria aula, outros iriam para suas cidades, outros teriam que trabalhar e outros apenas curtiriam o final de semana, como Sofia. Sem trocar uma palavra no tempo que esteve sentado com a roda de amigos, Beto se aproxima de Sofia e diz.
- Você é sempre quieta?
Ela não acredita no que ouve e fica sem voz. Afinal, o bonitão veio falar com ela. Como não obtém uma resposta, oferece uma carona para ela e a amiga. No carro, Berenice, a mais falante, puxa assunto e Sofia, no banco de trás, somente ri, e troca olhares com Beto. Ao chegarem à casa das meninas, Berenice desce e se despede, chamando Sofia, que tem sua mão segurada por Beto, que diz.
-Podemos só conversar antes de você subir?
Atenta, olha para amiga e pensa em tudo o que Berenice falou: (Ele já pegou todas as meninas, ele não presta, ele fica com um monte de meninas numa só noite.....).
- Sim, podemos – e sorri para Berenice, que a olha com ar de “eu avisei”.
Mas o rapaz, filho de empresária e médico da Capital Paulista, não queria apenas conversar. Foi para o banco de trás do carro e lá começou a alisar os cabelos de Sofia, que estava feliz, pois beijaria o bonitão da faculdade. E, claro, foi exatamente o que aconteceu. E tudo estava indo muito bem, quando Beto “tentou avançar o sinal”, colando suas mãos por dentro da calça de Sofia. E ela disse: “pára!”.
Ele, claro, sem entender nada, ficou assustado e perguntou o que houve. Ela, nervosa, já transpirava mais do que uma bica de água. Disse que não poderia fazer mais nada além daquilo e pronto. Ele não entendeu, mas respeitou e começaram a se beijar novamente. Com beijos loucos e ardentes a ponto de deixá-los cheios de tesão, ele começa a acariciar seus seios, deixando-a ainda mais cheia de desejo.
Foi quando ela tentou “fugir” dele e ele, sem entender nada, perguntou:
- Qual o seu problema? Mas gosta de receber carinhos?
Com a voz trêmula e envergonhada, ela responde:
- Nunca passei de beijos!
Ele não entendeu.
- Eu nunca fiz amor com ninguém! – ela exclama, e sai correndo.
Ao entrar no quarto, pensa na besteira que fez e se sente envergonhada, mas ao mesmo tempo entusiasmada. Foi a primeira vez que um homem a tocou daquela maneira, enchendo-a de desejos e novas descobertas. Assim, ela adormece, para começar uma nova etapa de sua vida......
(*) Estudante do 4º ano de Jornalismo das Faculdades Integradas Teresa D'Ávilla (FATEA), de Lorena-SP.
Na noite anterior tinha saído com alguns amigos da faculdade. Sofia cursava o 2º semestre de Direito e sempre teve ótimos relacionamentos com todos os alunos do curso e da faculdade. Queria como toda menina de 19 anos, se formar e ir embora da cidade aonde nascera e tinha sido criado.
Era filha única e seus pais sempre foram muito protetores. Quando passou no vestibular eles choraram de emoção e tristeza, porque a jovem menina de cabelos longos e pretos, partiria para uma cidade no interior de Minas Gerais.
A cidadezinha era pequena com apenas 50 mil habitantes todos praticamente se conheciam, era até perigoso falar mal de alguém, porque um poderia ser parente do outro e assim sucessivamente.
Mas naquela manhã, que Sofia foi acordada com o vento, ela estava trêmula e ansiosa. Na noite anterior saiu com um grupo de amigos da faculdade, aproximadamente 30, de vários cursos entre Agronomia, Comunicação, Direito e Medicina.
Ela era a mais jovem da turma e pode-se dizer a mais ingênua também. Desde criança sempre foi muito bonita, cabelo preto, longo pela cintura, olhos azuis que puxara de seus avós italianos, a pele parecia a de uma bonequinha de porcelana. Era baixa, apenas 1,60m, seu peso era compatível com seu tamanho.
Não gostava de praticar esportes. Sempre achou uma perda de tempo. Seus dotes eram naturais. Naquela noite, ao sair com os amigos, conheceu o jovem Beto, mais experiente que ela, tinha 25 anos e cursava o 8º período de Medicina.
Ele era natural da Capital de São Paulo, foi a primeira vez que se viram. Ao chegar, Sofia o avistou de longe e ficou encantada. Comentou com sua melhor amiga, Berenice:
- Bere, quem é aquele gato?
- Esquece não é pra você. Ele é um piranha!!! – exclamou Berenice
A amiga a alertou sobre o que poderia vir pela frente.
- Ah, diga quem é? – insistente, perguntou novamente
- Chama-se Beto, já pegou praticamente todas as meninas do Curso de Medicina. Ele faz residência no hospital da faculdade e da cidade. A cara de anjo engana, cuidado! – alertou Berenice.
Sem dar muita atenção ao que sua amiga falava, Sofia o admirava. Era alto, devia ter um 1,80m, tinha cabelos curtos e ajeitadinhos, seus olhos tinham cor de mel e sua boca carnuda chamava a atenção de todas as meninas. Todos sentados, bebendo, comendo, rindo. Sofia olhava-o sem parar. Sua amiga já havia lhe dado vários cutucões, mas ela exclamava:
- Ele é lindo! Vou beijá-lo!
- Amiga, ele não fica só nos beijos, cuidado. Você, além de nova, é ingênua – alertou Berenice.
Já passavam das 23h30, quando alguns começaram a se despedir. Afinal, no dia seguinte, sábado, alguns teria aula, outros iriam para suas cidades, outros teriam que trabalhar e outros apenas curtiriam o final de semana, como Sofia. Sem trocar uma palavra no tempo que esteve sentado com a roda de amigos, Beto se aproxima de Sofia e diz.
- Você é sempre quieta?
Ela não acredita no que ouve e fica sem voz. Afinal, o bonitão veio falar com ela. Como não obtém uma resposta, oferece uma carona para ela e a amiga. No carro, Berenice, a mais falante, puxa assunto e Sofia, no banco de trás, somente ri, e troca olhares com Beto. Ao chegarem à casa das meninas, Berenice desce e se despede, chamando Sofia, que tem sua mão segurada por Beto, que diz.
-Podemos só conversar antes de você subir?
Atenta, olha para amiga e pensa em tudo o que Berenice falou: (Ele já pegou todas as meninas, ele não presta, ele fica com um monte de meninas numa só noite.....).
- Sim, podemos – e sorri para Berenice, que a olha com ar de “eu avisei”.
Mas o rapaz, filho de empresária e médico da Capital Paulista, não queria apenas conversar. Foi para o banco de trás do carro e lá começou a alisar os cabelos de Sofia, que estava feliz, pois beijaria o bonitão da faculdade. E, claro, foi exatamente o que aconteceu. E tudo estava indo muito bem, quando Beto “tentou avançar o sinal”, colando suas mãos por dentro da calça de Sofia. E ela disse: “pára!”.
Ele, claro, sem entender nada, ficou assustado e perguntou o que houve. Ela, nervosa, já transpirava mais do que uma bica de água. Disse que não poderia fazer mais nada além daquilo e pronto. Ele não entendeu, mas respeitou e começaram a se beijar novamente. Com beijos loucos e ardentes a ponto de deixá-los cheios de tesão, ele começa a acariciar seus seios, deixando-a ainda mais cheia de desejo.
Foi quando ela tentou “fugir” dele e ele, sem entender nada, perguntou:
- Qual o seu problema? Mas gosta de receber carinhos?
Com a voz trêmula e envergonhada, ela responde:
- Nunca passei de beijos!
Ele não entendeu.
- Eu nunca fiz amor com ninguém! – ela exclama, e sai correndo.
Ao entrar no quarto, pensa na besteira que fez e se sente envergonhada, mas ao mesmo tempo entusiasmada. Foi a primeira vez que um homem a tocou daquela maneira, enchendo-a de desejos e novas descobertas. Assim, ela adormece, para começar uma nova etapa de sua vida......
(*) Estudante do 4º ano de Jornalismo das Faculdades Integradas Teresa D'Ávilla (FATEA), de Lorena-SP.
quarta-feira, 11 de junho de 2008
Meu esporte preferido é esquecer você, por Eduardo Murta
Eduardo Murta (*)
Daqui se vê, pela foto, como aquele havia sido um tempo de provações para Augusto. Logo ele, crente fiel à máxima de que nascera bicho-homem, moldado a prestar satisfações tão-somente ao vento. A mais ninguém. Assim, ligava um nada aos que diziam que fazia estilo playboy. Fazia mesmo. E daí? À mais rasteira das submissões – trabalhar – já tinha se convertido. Nada por convicção, claro, mas a que não dependesse um tostão de pai ou mãe.
Foi que aos 13, burlando lei e vigilância paterna, buscou ofício e renda. Burlesco, admitia. Mas o bastante a que garantisse o extra no começo de mês. Ele, porta em porta, com vidrinhos de perfume. Oitava qualidade. E como vendia. Rendia-lhe também vergonha. E, noutra ponta, um palpite que se consumaria numa feliz constatação. A de que era belo. Belíssimo. Irresistível.
Perdera a conta de quantas juras de amor ouvira em dez minutos de conversa meramente comercial. E de quantas vezes beijara na boca e se entrelaçara às coxas de cinqüentonas, quarentonas, trintonas. Gatinhas de 20. Menininhas na faixa dos 15. Começava até a duvidar de suas habilidades de vendedor. Passava a crer, mais e vigorosamente, em sua veia de sedução.
E não era casual. Corpo à forma de quem fora esculpido. Linhas de anjo aos cabelos. E rosto que misturava olhos de águia, boca à Rodolfo Valentino. Se pusera mal acostumado. Ao revés, talvez. Muitíssimo bem habituado. Ia ganhando, então, duas certezas na vida: a de que queria continuar vivendo exatamente daquela maneira, e a de que se inscreveria para sempre no clube dos solteiros.
Aos 16, não fazia mais idéia da coleção de mulheres às quais dissera não. Sem um pingo de culpa. Se virava e partia. Dispensara as esculturais, as desconcertantes. Resistira às avassaladoras. E, nos negócios, experimentara de vendedor de planos de saúde a ações na Bolsa, automóveis, emagrecedores, artigos de sex-shop. Mergulhara, puro êxtase, numa rotina de viagens, baladas, esportes radicais, circuitos gastronômicos, mundo fashion...
Havia se convertido, no fundo, num vendedor de ilusões. Ainda que jamais houvesse mentido para ter qualquer mulher à cama. Fosse resumir, sem modéstia, diria que simplesmente não resistiam. E ponto. Augusto cunharia, na linhagem de conquistas, frase que se tornaria célebre: “Amo fazer amor, mas amo também esquecer”. Semana virava, e lá estava ele com outra gata. A da hora, Juju, 22 anos. Universitária. Estampa de modelo.
Conhecera numa festa. Até topou cinema, a que variasse um pouco. Talvez tenha errado em estratégia ali. Deu, um tanto sem querer, com os olhos dela vidrados na tela. Era um drama, mal prestara atenção. As órbitas marejas, em algum sentido, lhe bambearam sentimentos. Mais ainda quando, espontâneas, as mãos perfumadas buscaram as dele. Mornas, se entrincheirando entre as pipocas e o sal.
Pela primeira vez, se flagrara vendido. Em joelhos. A foto, percebam é desse tempo. Ele se curvando à monogamia. Derivando paixão. E vendo Juju, mesmo lhe declarando amor divino, escapar-lhe por entre os dedos. Não compreendia. Não se conformava. Buscou de novo baladas. Efervescência. Boates. O book das mulheres. Rostos em penumbra forçada nas imagens, se mirou primeiro nas coxas. Familiares. Depois, os seios rosados. Inconfundíveis. Por fim, a frase acompanhando a ficha da garota. Singular: “Amo fazer amor, mas amo também esquecer”. É dela, sempre dela, que Gustavo se recorda assim nas noites eternamente sem sono em que sua vida se converteu. Ah, mulheres insensíveis....
(*) Jornalista, autor de "Tantas Histórias. Pessoas Tantas", livro lançado em maio de 2006, que reúne 50 crônicas selecionadas publicadas na imprensa. É secretário de Redação do jornal Hoje em Dia, diário de Belo Horizonte. Já teve passagens também pelos jornais Diário de Minas e Estado de Minas, além de Folha de S.Paulo e revista Veja. É um dos colunistas do Hoje em Dia, onde publica às quartas-feiras.
Daqui se vê, pela foto, como aquele havia sido um tempo de provações para Augusto. Logo ele, crente fiel à máxima de que nascera bicho-homem, moldado a prestar satisfações tão-somente ao vento. A mais ninguém. Assim, ligava um nada aos que diziam que fazia estilo playboy. Fazia mesmo. E daí? À mais rasteira das submissões – trabalhar – já tinha se convertido. Nada por convicção, claro, mas a que não dependesse um tostão de pai ou mãe.
Foi que aos 13, burlando lei e vigilância paterna, buscou ofício e renda. Burlesco, admitia. Mas o bastante a que garantisse o extra no começo de mês. Ele, porta em porta, com vidrinhos de perfume. Oitava qualidade. E como vendia. Rendia-lhe também vergonha. E, noutra ponta, um palpite que se consumaria numa feliz constatação. A de que era belo. Belíssimo. Irresistível.
Perdera a conta de quantas juras de amor ouvira em dez minutos de conversa meramente comercial. E de quantas vezes beijara na boca e se entrelaçara às coxas de cinqüentonas, quarentonas, trintonas. Gatinhas de 20. Menininhas na faixa dos 15. Começava até a duvidar de suas habilidades de vendedor. Passava a crer, mais e vigorosamente, em sua veia de sedução.
E não era casual. Corpo à forma de quem fora esculpido. Linhas de anjo aos cabelos. E rosto que misturava olhos de águia, boca à Rodolfo Valentino. Se pusera mal acostumado. Ao revés, talvez. Muitíssimo bem habituado. Ia ganhando, então, duas certezas na vida: a de que queria continuar vivendo exatamente daquela maneira, e a de que se inscreveria para sempre no clube dos solteiros.
Aos 16, não fazia mais idéia da coleção de mulheres às quais dissera não. Sem um pingo de culpa. Se virava e partia. Dispensara as esculturais, as desconcertantes. Resistira às avassaladoras. E, nos negócios, experimentara de vendedor de planos de saúde a ações na Bolsa, automóveis, emagrecedores, artigos de sex-shop. Mergulhara, puro êxtase, numa rotina de viagens, baladas, esportes radicais, circuitos gastronômicos, mundo fashion...
Havia se convertido, no fundo, num vendedor de ilusões. Ainda que jamais houvesse mentido para ter qualquer mulher à cama. Fosse resumir, sem modéstia, diria que simplesmente não resistiam. E ponto. Augusto cunharia, na linhagem de conquistas, frase que se tornaria célebre: “Amo fazer amor, mas amo também esquecer”. Semana virava, e lá estava ele com outra gata. A da hora, Juju, 22 anos. Universitária. Estampa de modelo.
Conhecera numa festa. Até topou cinema, a que variasse um pouco. Talvez tenha errado em estratégia ali. Deu, um tanto sem querer, com os olhos dela vidrados na tela. Era um drama, mal prestara atenção. As órbitas marejas, em algum sentido, lhe bambearam sentimentos. Mais ainda quando, espontâneas, as mãos perfumadas buscaram as dele. Mornas, se entrincheirando entre as pipocas e o sal.
Pela primeira vez, se flagrara vendido. Em joelhos. A foto, percebam é desse tempo. Ele se curvando à monogamia. Derivando paixão. E vendo Juju, mesmo lhe declarando amor divino, escapar-lhe por entre os dedos. Não compreendia. Não se conformava. Buscou de novo baladas. Efervescência. Boates. O book das mulheres. Rostos em penumbra forçada nas imagens, se mirou primeiro nas coxas. Familiares. Depois, os seios rosados. Inconfundíveis. Por fim, a frase acompanhando a ficha da garota. Singular: “Amo fazer amor, mas amo também esquecer”. É dela, sempre dela, que Gustavo se recorda assim nas noites eternamente sem sono em que sua vida se converteu. Ah, mulheres insensíveis....
(*) Jornalista, autor de "Tantas Histórias. Pessoas Tantas", livro lançado em maio de 2006, que reúne 50 crônicas selecionadas publicadas na imprensa. É secretário de Redação do jornal Hoje em Dia, diário de Belo Horizonte. Já teve passagens também pelos jornais Diário de Minas e Estado de Minas, além de Folha de S.Paulo e revista Veja. É um dos colunistas do Hoje em Dia, onde publica às quartas-feiras.
segunda-feira, 9 de junho de 2008
Filosofia de banheiro, por Rodrigo Ramazzini
Rodrigo Ramazzini (*)
Era véspera de feriadão. Augusto, aproveitando a folga, programou uma visita aos pais, que moravam em uma cidade a pouco mais de uma hora e meia de ônibus. Chegou à rodoviária, e como sempre acontece nestas ocasiões, as filas dos guichês para compra de passagem estavam lotadas. Demorou cerca de vinte minutos para ser atendido. Comprou a passagem, porém, o horário de partida do ônibus seria somente dali a uma hora. Resolveu, então, sentar-se em uma pequena lanchonete para comer um pastel e tomar um refrigerante.
Comprou um vultoso pastel de carne calabresa e um refrigerante de dois litros, pois o único que gostava só tinha nesta quantidade. Ficou a saborear o pastel e a tomar o refrigerante por uns trinta e cinco minutos. Satisfeito, levantou-se e se dirigiu ao banheiro, pois o um litro e meio de refrigerante que ingerira já estava fazendo efeito.
Com a rodoviária lotada, o banheiro estava sendo bastante utilizado. A fila iniciava na porta e ganhava uma boa extensão. Augusto entrou na fila e ficou a esperar a sua vez.
Quando estava quase entrando no banheiro, e a vontade de urinar era grande, Augusto olhou o relógio e viu que faltavam cinco minutos para a partida do seu ônibus. Com medo de perdê-lo, pensou: “Eu agüento”. E saiu da fila, rumando para o box de embarque.
Embarcou no ônibus e sentou-se na poltrona 33, ao lado da janela. Na poltrona “do corredor”, uma senhora, com os cabelos fortemente pintados de preto e uns óculos com lentes bastante grossas, lhe faria companhia pela uma hora e meia de viagem que os aguardava.
Passados quinze minutos de viagem, Augusto começou a sofrer devido à grande vontade de urinar. A sua bexiga parecia ter enchido por completo. Mesmo com dificuldades e gemendo um pouco, conseguiu averiguar que o ônibus não possuía banheiro. Passando a mão pelo rosto, limpou uma gota de suor e abriu a janela para entrar um ar, pois o ônibus também não tinha ar-condicionado.
Certo alívio viera, mesmo com o olhar apavorado da senhora ao seu lado, quando Augusto, em um ato extremo, abriu o cinto e o zíper da sua calça. Deixou escapar um “ufa”, mas a sensação de “conforto” não durou muito, pois parecia que a cada segundo mais lhe enchia a bexiga.
O tempo não passava. Também pudera, Augusto olhava de três em três minutos para o relógio. O “aperto” já lhe causava dores na região da barriga. Gotas de suor escorriam por suas frontes. Visto o desespero que se encontrava, pensou em pedir para o ônibus interromper a viagem por um instante, para que ele pudesse urinar em um mato qualquer.
Com os olhos fechados, Augusto respirava profunda e lentamente. Foi quando sentiu que o ônibus parara. Havia chegado ao seu destino. Enfim, estava na rodoviária.
Mesmo em apuros, Augusto foi o último a desembarcar do ônibus. Com cuidados, pois não queria que ocorresse qualquer acidente nas calças, rumou até o sanitário mais próximo.
Ingressou no banheiro, viu uma “vaga” em aberto, fechou a porta, levantou a tampa do vaso sanitário e: “Aaaaaaaaahhhh!”.
Foi então que, enquanto desaguava uma “Cataratas do Iguaçu”, Augusto viveu um momento filosófico no banheiro, quando ao olhar para frente, viu escrita na parede a frase que o deixou vários dias a refletir até entendê-la: “O futuro está em suas mãos!”.
(*) Jornalista e cronista
Era véspera de feriadão. Augusto, aproveitando a folga, programou uma visita aos pais, que moravam em uma cidade a pouco mais de uma hora e meia de ônibus. Chegou à rodoviária, e como sempre acontece nestas ocasiões, as filas dos guichês para compra de passagem estavam lotadas. Demorou cerca de vinte minutos para ser atendido. Comprou a passagem, porém, o horário de partida do ônibus seria somente dali a uma hora. Resolveu, então, sentar-se em uma pequena lanchonete para comer um pastel e tomar um refrigerante.
Comprou um vultoso pastel de carne calabresa e um refrigerante de dois litros, pois o único que gostava só tinha nesta quantidade. Ficou a saborear o pastel e a tomar o refrigerante por uns trinta e cinco minutos. Satisfeito, levantou-se e se dirigiu ao banheiro, pois o um litro e meio de refrigerante que ingerira já estava fazendo efeito.
Com a rodoviária lotada, o banheiro estava sendo bastante utilizado. A fila iniciava na porta e ganhava uma boa extensão. Augusto entrou na fila e ficou a esperar a sua vez.
Quando estava quase entrando no banheiro, e a vontade de urinar era grande, Augusto olhou o relógio e viu que faltavam cinco minutos para a partida do seu ônibus. Com medo de perdê-lo, pensou: “Eu agüento”. E saiu da fila, rumando para o box de embarque.
Embarcou no ônibus e sentou-se na poltrona 33, ao lado da janela. Na poltrona “do corredor”, uma senhora, com os cabelos fortemente pintados de preto e uns óculos com lentes bastante grossas, lhe faria companhia pela uma hora e meia de viagem que os aguardava.
Passados quinze minutos de viagem, Augusto começou a sofrer devido à grande vontade de urinar. A sua bexiga parecia ter enchido por completo. Mesmo com dificuldades e gemendo um pouco, conseguiu averiguar que o ônibus não possuía banheiro. Passando a mão pelo rosto, limpou uma gota de suor e abriu a janela para entrar um ar, pois o ônibus também não tinha ar-condicionado.
Certo alívio viera, mesmo com o olhar apavorado da senhora ao seu lado, quando Augusto, em um ato extremo, abriu o cinto e o zíper da sua calça. Deixou escapar um “ufa”, mas a sensação de “conforto” não durou muito, pois parecia que a cada segundo mais lhe enchia a bexiga.
O tempo não passava. Também pudera, Augusto olhava de três em três minutos para o relógio. O “aperto” já lhe causava dores na região da barriga. Gotas de suor escorriam por suas frontes. Visto o desespero que se encontrava, pensou em pedir para o ônibus interromper a viagem por um instante, para que ele pudesse urinar em um mato qualquer.
Com os olhos fechados, Augusto respirava profunda e lentamente. Foi quando sentiu que o ônibus parara. Havia chegado ao seu destino. Enfim, estava na rodoviária.
Mesmo em apuros, Augusto foi o último a desembarcar do ônibus. Com cuidados, pois não queria que ocorresse qualquer acidente nas calças, rumou até o sanitário mais próximo.
Ingressou no banheiro, viu uma “vaga” em aberto, fechou a porta, levantou a tampa do vaso sanitário e: “Aaaaaaaaahhhh!”.
Foi então que, enquanto desaguava uma “Cataratas do Iguaçu”, Augusto viveu um momento filosófico no banheiro, quando ao olhar para frente, viu escrita na parede a frase que o deixou vários dias a refletir até entendê-la: “O futuro está em suas mãos!”.
(*) Jornalista e cronista
quinta-feira, 5 de junho de 2008
Ao mestre com carinho, por Fábio de Lima
Fábio de Lima (*)
- Feche os olhos.
- Mas aí eu não vou enxergar nada.
- Você é que pensa. Experimente. Vamos fechar os olhos juntos.
Era uma tarde de domingo. Fazia um frio intenso na montanha Tonosso, ao Sul de Okinawa. Eu havia saído do Brasil e ido para o Japão sem saber ao certo o que faria naquela terra distante. Não era de família japonesa, nem tinha amigos próximos que tivessem qualquer relação com aquele País. Mas sentia uma necessidade de conhecer a terra do sol nascente. Então, fui.
- Ao fechar os olhos podemos enxergar o mundo da maneira que queremos. Nada é proibido, entende?
- Acho que sim.
Eu viajei sem saber o idioma. Estava com pouco dinheiro no bolso. A única precaução que tive foi avisar alguns familiares e amigos da minha viagem e pedir a eles que mantivessem contato comigo. Alertei-os também que se surgisse algum problema e eu não conseguisse resolver, ou se de repente eu deixasse de manter contato, que todos eles procurassem o governo brasileiro e pedisse um socorro em meu nome.
- Mestre, eu sempre só fechei os olhos quando ia dormir ou quando estava com a vista cansada. Quando os meus olhos doíam de tanto ler eu os fechava por alguns segundos e depois os abria para me sentir melhor.
- Dava certo?
- Sim. Quando eu abria os olhos a vista parecia menos cansada. Mas essa sensação durava pouco tempo.
- Entendo. O ser humano aprendeu a fechar os olhos apenas para dormir e para morrer, né?
Mestre Nashimura tinha 87 anos, embora aparentasse não mais que 60 anos. Falava português de uma forma engraçada, do jeito que brasileiro imita japonês falando. Ele havia morado no Brasil por 20 anos – de 1954 a 1974. No tempo que esteve no Brasil trabalhou na agricultura e na feira. Nunca se casou e nem teve filhos, mas deixou alguns familiares e amigos por aqui. Mas eu o conheci no próprio Japão por acaso mesmo, se é que o acaso existe.
Quando cheguei ao Japão sabia haver colônias de dekasseguis espalhadas por várias regiões do País. Procurei algumas dessas colônias e expliquei que estava no Japão para passar um tempo – mas que diferente dos dekasseguis eu não tinha nenhuma ligação com o País e precisava de uma ajuda. Eles entenderam minha situação rapidamente, pois se eles que tinham raízes japonesas sofriam discriminação e enfrentavam as mais diversas dificuldades, sabiam que minha estadia lá seria muito mais difícil ainda.
Numa dessas colônias, já no Sul do Japão, conheci o Marcos, bisneto de japoneses, que estava no Japão fazia dois anos. Ele me levou até um mercadinho para me apresentar aos donos e tentar me arrumar um emprego. Lá passei a trabalhar como empacotador ao lado de um velhinho de quase 90 anos e que falava português por já ter morado no Brasil. Esse empacotador antigo era Nashimura que não só me ajudou em meu novo trabalho como também me ensinou a pensar – coisa que sempre achei que fazia, mas que descobri, somente no Japão, que eu nunca pensara de verdade. Eu apenas achava que fazia isso. Pensar é algo diferente. Pensar é algo sublime e poucos o fazem.
- Depois que a gente nasce não pára de aprender. Aprende a andar, falar, estudar e trabalhar. Mas aí a gente chega à idade adulta e acha que já aprendeu tudo. Está aí o erro.
- Verdade, mestre. Mas não podemos generalizar. Nem todo mundo é assim. Alguns levam a vida toda aprendendo, mesmo nas coisas mais simples.
- Sim. São pessoas mais evoluídas. Elas sabem que por mais que saibam não sabem muito. Se assim o fosse não estariam aqui e sim em dimensões mais evoluídas.
- Dimensões mais evoluídas! Essas coisas existem mesmo, mestre?
- Não sei. Isso não é importante agora.
- Pensei que o senhor soubesse ou pelo menos me diria que acreditava nessas dimensões, em outros planetas, sei lá.
- Eu acredito. Mas acreditar não é saber. Eu não tenho certeza de nada. E também não tenho vergonha em dizer que não sei.
- Entendo.
Eu vivi oito meses em Okinawa, no Sul do Japão. Trabalhava de segunda a sábado, das 7h00 às 17h00. No domingo gostávamos, eu e Nashimura, de andar pela região – viajar pelas cidades e vilas vizinhas. Estive na montanha Tonasso por umas 15 vezes, pelo menos. Foi lá que mestre Nashimura me ensinou filosofia, psicologia, sociologia – entre várias outras coisas. Tudo de uma maneira simples, com conversas sobre gente, vida, morte, trabalho e inúmeros outros assuntos.
- Você já vai embora na próxima semana?
- Sim, mestre. Sinto saudade do Brasil.
- Saudade boa?
- Sim. Acho que sim. Vontade de rever minha família e meus amigos.
- Bom.
- Também vou sentir saudade disso aqui. Sentirei saudade do senhor.
- Bom.
- O senhor não quer ir comigo para o Brasil?
- Não.
- Não?! O senhor não sente saudade de lá?
- Não.
- Mas o senhor me disse ter gostado muito de viver lá.
- Gostei.
- Então?!
- Então o quê?
- Deveria sentir saudade, não?
- Não sei. Só sei que não sinto. Acho que depois de uma certa idade a gente não sente saudade de muita coisa. A gente lembra com carinho, mas saudade não sente mais. Eu acho que é assim com todo mundo.
Três semanas depois que regressei ao Brasil recebi um e-mail do Marcos me contando que Nashimura havia morrido. Ele morreu dormindo. Assim, foi embora o meu mestre. Aprendi a chamá-lo dessa forma, carinhosamente, desde o primeiro dia que o conheci. Ele me ensinou a ser um homem mais tranqüilo. Segundo suas palavras, só a tranqüilidade não resolve nenhum problema, mas a intranqüilidade faz aflorar todos os problemas do mundo. Ao receber aquele e-mail eu fechei os olhos por alguns minutos e durante esse tempo pude ter Nashimura novamente ao meu lado me ensinando sobre a vida que ele tanto amava e valorizava. Depois meus olhos tiveram que novamente serem abertos, porque como dizia o mestre, o ser humano só aprendeu a fechar os olhos para dormir e para morrer. Saudade, mestre!
(*) Jornalista e escritor, ou “contador de histórias”, como prefere ser chamado. Está escrevendo seu primeiro romance, DOCE DESESPERO, com publicação (ainda!) em data incerta.
- Feche os olhos.
- Mas aí eu não vou enxergar nada.
- Você é que pensa. Experimente. Vamos fechar os olhos juntos.
Era uma tarde de domingo. Fazia um frio intenso na montanha Tonosso, ao Sul de Okinawa. Eu havia saído do Brasil e ido para o Japão sem saber ao certo o que faria naquela terra distante. Não era de família japonesa, nem tinha amigos próximos que tivessem qualquer relação com aquele País. Mas sentia uma necessidade de conhecer a terra do sol nascente. Então, fui.
- Ao fechar os olhos podemos enxergar o mundo da maneira que queremos. Nada é proibido, entende?
- Acho que sim.
Eu viajei sem saber o idioma. Estava com pouco dinheiro no bolso. A única precaução que tive foi avisar alguns familiares e amigos da minha viagem e pedir a eles que mantivessem contato comigo. Alertei-os também que se surgisse algum problema e eu não conseguisse resolver, ou se de repente eu deixasse de manter contato, que todos eles procurassem o governo brasileiro e pedisse um socorro em meu nome.
- Mestre, eu sempre só fechei os olhos quando ia dormir ou quando estava com a vista cansada. Quando os meus olhos doíam de tanto ler eu os fechava por alguns segundos e depois os abria para me sentir melhor.
- Dava certo?
- Sim. Quando eu abria os olhos a vista parecia menos cansada. Mas essa sensação durava pouco tempo.
- Entendo. O ser humano aprendeu a fechar os olhos apenas para dormir e para morrer, né?
Mestre Nashimura tinha 87 anos, embora aparentasse não mais que 60 anos. Falava português de uma forma engraçada, do jeito que brasileiro imita japonês falando. Ele havia morado no Brasil por 20 anos – de 1954 a 1974. No tempo que esteve no Brasil trabalhou na agricultura e na feira. Nunca se casou e nem teve filhos, mas deixou alguns familiares e amigos por aqui. Mas eu o conheci no próprio Japão por acaso mesmo, se é que o acaso existe.
Quando cheguei ao Japão sabia haver colônias de dekasseguis espalhadas por várias regiões do País. Procurei algumas dessas colônias e expliquei que estava no Japão para passar um tempo – mas que diferente dos dekasseguis eu não tinha nenhuma ligação com o País e precisava de uma ajuda. Eles entenderam minha situação rapidamente, pois se eles que tinham raízes japonesas sofriam discriminação e enfrentavam as mais diversas dificuldades, sabiam que minha estadia lá seria muito mais difícil ainda.
Numa dessas colônias, já no Sul do Japão, conheci o Marcos, bisneto de japoneses, que estava no Japão fazia dois anos. Ele me levou até um mercadinho para me apresentar aos donos e tentar me arrumar um emprego. Lá passei a trabalhar como empacotador ao lado de um velhinho de quase 90 anos e que falava português por já ter morado no Brasil. Esse empacotador antigo era Nashimura que não só me ajudou em meu novo trabalho como também me ensinou a pensar – coisa que sempre achei que fazia, mas que descobri, somente no Japão, que eu nunca pensara de verdade. Eu apenas achava que fazia isso. Pensar é algo diferente. Pensar é algo sublime e poucos o fazem.
- Depois que a gente nasce não pára de aprender. Aprende a andar, falar, estudar e trabalhar. Mas aí a gente chega à idade adulta e acha que já aprendeu tudo. Está aí o erro.
- Verdade, mestre. Mas não podemos generalizar. Nem todo mundo é assim. Alguns levam a vida toda aprendendo, mesmo nas coisas mais simples.
- Sim. São pessoas mais evoluídas. Elas sabem que por mais que saibam não sabem muito. Se assim o fosse não estariam aqui e sim em dimensões mais evoluídas.
- Dimensões mais evoluídas! Essas coisas existem mesmo, mestre?
- Não sei. Isso não é importante agora.
- Pensei que o senhor soubesse ou pelo menos me diria que acreditava nessas dimensões, em outros planetas, sei lá.
- Eu acredito. Mas acreditar não é saber. Eu não tenho certeza de nada. E também não tenho vergonha em dizer que não sei.
- Entendo.
Eu vivi oito meses em Okinawa, no Sul do Japão. Trabalhava de segunda a sábado, das 7h00 às 17h00. No domingo gostávamos, eu e Nashimura, de andar pela região – viajar pelas cidades e vilas vizinhas. Estive na montanha Tonasso por umas 15 vezes, pelo menos. Foi lá que mestre Nashimura me ensinou filosofia, psicologia, sociologia – entre várias outras coisas. Tudo de uma maneira simples, com conversas sobre gente, vida, morte, trabalho e inúmeros outros assuntos.
- Você já vai embora na próxima semana?
- Sim, mestre. Sinto saudade do Brasil.
- Saudade boa?
- Sim. Acho que sim. Vontade de rever minha família e meus amigos.
- Bom.
- Também vou sentir saudade disso aqui. Sentirei saudade do senhor.
- Bom.
- O senhor não quer ir comigo para o Brasil?
- Não.
- Não?! O senhor não sente saudade de lá?
- Não.
- Mas o senhor me disse ter gostado muito de viver lá.
- Gostei.
- Então?!
- Então o quê?
- Deveria sentir saudade, não?
- Não sei. Só sei que não sinto. Acho que depois de uma certa idade a gente não sente saudade de muita coisa. A gente lembra com carinho, mas saudade não sente mais. Eu acho que é assim com todo mundo.
Três semanas depois que regressei ao Brasil recebi um e-mail do Marcos me contando que Nashimura havia morrido. Ele morreu dormindo. Assim, foi embora o meu mestre. Aprendi a chamá-lo dessa forma, carinhosamente, desde o primeiro dia que o conheci. Ele me ensinou a ser um homem mais tranqüilo. Segundo suas palavras, só a tranqüilidade não resolve nenhum problema, mas a intranqüilidade faz aflorar todos os problemas do mundo. Ao receber aquele e-mail eu fechei os olhos por alguns minutos e durante esse tempo pude ter Nashimura novamente ao meu lado me ensinando sobre a vida que ele tanto amava e valorizava. Depois meus olhos tiveram que novamente serem abertos, porque como dizia o mestre, o ser humano só aprendeu a fechar os olhos para dormir e para morrer. Saudade, mestre!
(*) Jornalista e escritor, ou “contador de histórias”, como prefere ser chamado. Está escrevendo seu primeiro romance, DOCE DESESPERO, com publicação (ainda!) em data incerta.
segunda-feira, 2 de junho de 2008
Menina-veneno, por Pedro J. Bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk (*)
Rosa achava Jorge um cretino. Para ela, o rapaz não passava de um bobo alegre, que não sabia usufruir os benefícios que sua condição financeira lhe permitia gozar. “Por que será que neste mundo só tem asas quem não sabe voar?” – se perguntava, sempre que pensava no rapaz.
Não negava que se sentia atraída sexualmente por ele, mas não tinha nenhuma esperança de que fosse correspondida. Considerava-o um molenga, um maricas, talvez fosse até mesmo veado. Mas era, sobretudo, um mimado, um filhinho de papai, que nada conhecia da vida e de suas rudezas, cercado que estava pela saia protetora da mamãe.
Achava que Jorge não entendia nada, e nem poderia entender, sobre as pessoas que o rodeavam, com suas ambições e desejos, quase nunca honestos e justos. Sabia que era notada, adorada, cobiçada, venerada até pelo rapaz, mas se tornava, de caso pensado, difícil, até mesmo inacessível e sentia enorme prazer em ser assediada e poder recusar o assédio.
Justo ela, que sempre oferecera aos homens o seu corpo, muito bem torneado e apetitoso, não raro em troca de um simples sanduíche de mortadela. Quantas vezes fizera sexo em plena rua, de pé, encostada num poste, como uma cadela. Gostava que a chamassem desse jeito.
Rosa estava decidida a prolongar ao máximo esse jogo de sedução, que tamanha satisfação lhe causava. Tratava-se de uma mulher de beleza acima da média. Era morena, cabelos longos e sedosos, pele delicada, olhos verdes e expressivos que pareciam sorrir de malícia, lábios vermelhos e carnosos e seios empinados, nem grandes e nem pequenos, desses que cabem em uma taça de champanhe. Tinha l,65 metro de charme e veneno, pernas bem torneadas e pés pequenos e delicados. Sua beleza, porém, não combinava com sua moral. Não hesitaria em destruir quem quer que fosse, se isso lhe trouxesse a mínima vantagem.
Muitas vezes, só em lembrar o embaraço, o desespero e a confusão de Jorge, quando em sua presença, Rosa excitava-se de tal forma que chegava a atingir o orgasmo, sem precisar se masturbar. Sentia-se como que possuída por um homem ideal, com o máximo requinte do sexo. Como se fosse apertada, tocada, lambida, penetrada com fúria até o fundo do útero. E então gozava. Gozava farta e copiosamente, como jamais homem algum a fizera gozar.
Gostaria que Marrom estivesse em liberdade, para avaliar o quanto ela progredira. Quando veio de Minas para Campinas, fugindo dos pais, ou melhor, da vergonha de estar esperando um filho ilegítimo, numa época em que isso era considerado muito pior do que a prostituição, Rosa era uma criança. Contava, então, com catorze anos. Sequer havia ainda largado das bonecas.
Encantara-se por Juvenal, inquilino de seu pai, que a iniciou na prática do sexo. Tudo começou com uma troca de olhares, que evoluiu para fortuitas bolinações, até chegar no finalmente. Lembrava-se, deliciada, da tarde em que perdeu a virgindade. A primeira transa nunca se esquece.
Ambos passaram a fazer sexo com regularidade. Até que um dia a menstruação de Rosa atrasou. Comprou um kit, na farmácia, para saber se estava ou não grávida. Deu positivo. Juvenal desconversou, quando ela lhe deu a notícia. Mais tarde, Rosa ficou sabendo que ele era casado e tinha três filhos.
Quando a barriga começou a crescer, resolveu fugir de casa. Nem lhe passou pela cabeça como faria para se sustentar, ela que não tinha profissão alguma. Escolheu Campinas por acaso e, sem dinheiro para prosseguir até São Paulo, para onde planejara ir, ficou por aqui mesmo.
Perambulando pelas ruas da cidade, suja, maltrapilha e faminta, e ainda por cima grávida, precisou esmolar para comer. Depois que teve a criança, que nunca chegou a ver e pela qual nutria um ódio irracional, conseguiu se colocar como doméstica na casa de uma respeitável família no bairro Guanabara, proximidades da estação rodoviária.
Todavia, sua ineficiência e falta de vontade de trabalhar, fizeram que durasse pouco no emprego. Um dia, perambulando pelo Mercadão, foi abordada por Marrom. Começava ali um novo capítulo em sua vida. Estava dando, naquele momento, mais um passo no sentido da completa degradação.
Marrom era um mulato espigado, de cerca de 30 anos de idade, ladrão e gigolô. Sua principal fonte de sustento era algumas prostitutas que “protegia”. Seu olho clínico viu em Rosa uma mina de ouro. A moça havia amadurecido fisicamente, após o parto. Transformara-se numa belíssima mulher. Certamente, se treinada e preparada adequadamente, não faria feio como modelo.
O marginal conduziu-a a um sobrado nos arredores, numa rua lateral, próxima do Mercadão. Lá havia mais quatro mulheres que viviam da prostituição. Nenhuma delas, porém, chegava aos pés de Rosa. Vestiam-se com desleixo e abusavam da maquiagem, para disfarçar rugas precoces.
A partir daí, a moça transformou-se numa propriedade do marginal. Era como se fosse seu relógio, seu isqueiro ou o seu anel. É verdade que tinha três refeições diárias, um lugar para morar e dinheiro para comprar roupas melhores. Não se trajava como prostituta. Vestia-se com muito bom-gosto, o que realçava a sua beleza.
Marrom lhe destinava um terço do que ganhava, recebendo até quinze homens por dia. Estava contente com o que tinha, mas de vez em quando lamentava a perda da dignidade, do amor-próprio, da independência. Nessas ocasiões, raras por sinal, concluía que esse tipo de vida não valia a pena e fazia projetos para mudar. Mas como?
Depois que Marrom foi preso e condenado a quinze anos de prisão, por uma série de furtos que tinha cometido, Rosa resolveu trabalhar por conta. Conseguiu emprego de arrumadeira numa pensão da Avenida Andrade Neves e, nas horas de folga (e até mesmo nas de serviço), suplementava a renda, dormindo com os hóspedes. Mas agia de forma discreta, para não ser descoberta.
Toda a vez que podia, furtava objetos de valor, dinheiro, roupas e até mesmo documentos, que devolvia aos donos, afirmando que os achara na rua, recebendo, não raro, significativas gratificações de seus donos agradecidos. Nunca ninguém desconfiou do golpe.
A miséria e a exploração tornaram-na degradada, cínica, sem sentimentos, sem compaixão ou qualquer espécie de escrúpulo. Fazia qualquer coisa por dinheiro e não tinha consideração por ninguém, nem por ela própria. Vendera a alma ao demônio.
Certa ocasião, por um bom pagamento, aceitou se submeter a uma curra, numa república de estudantes, mantendo relações sexuais com doze pessoas numa só noite. Isso era fichinha para ela. E apesar de fazer do sexo uma fonte de renda, gostava de ser possuída.
A “mina de ouro” que agora tinha em mente se chamava Jorge Smith. É certo que tinha um obstáculo imenso, aparentemente intransponível, a superar. Ou seja, os severos e puritanos pais do rapaz, evangélicos que, certamente, fariam de tudo para impedir esse relacionamento. Mas Rosa confiava em seu talento inato de atriz e, sobretudo, na irrefletida paixão do meu ingênuo amigo, que não tinha a mínima noção de estar lidando com a menina-veneno, na acepção da palavra, para dar seu golpe do baú.
(*) Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com
Rosa achava Jorge um cretino. Para ela, o rapaz não passava de um bobo alegre, que não sabia usufruir os benefícios que sua condição financeira lhe permitia gozar. “Por que será que neste mundo só tem asas quem não sabe voar?” – se perguntava, sempre que pensava no rapaz.
Não negava que se sentia atraída sexualmente por ele, mas não tinha nenhuma esperança de que fosse correspondida. Considerava-o um molenga, um maricas, talvez fosse até mesmo veado. Mas era, sobretudo, um mimado, um filhinho de papai, que nada conhecia da vida e de suas rudezas, cercado que estava pela saia protetora da mamãe.
Achava que Jorge não entendia nada, e nem poderia entender, sobre as pessoas que o rodeavam, com suas ambições e desejos, quase nunca honestos e justos. Sabia que era notada, adorada, cobiçada, venerada até pelo rapaz, mas se tornava, de caso pensado, difícil, até mesmo inacessível e sentia enorme prazer em ser assediada e poder recusar o assédio.
Justo ela, que sempre oferecera aos homens o seu corpo, muito bem torneado e apetitoso, não raro em troca de um simples sanduíche de mortadela. Quantas vezes fizera sexo em plena rua, de pé, encostada num poste, como uma cadela. Gostava que a chamassem desse jeito.
Rosa estava decidida a prolongar ao máximo esse jogo de sedução, que tamanha satisfação lhe causava. Tratava-se de uma mulher de beleza acima da média. Era morena, cabelos longos e sedosos, pele delicada, olhos verdes e expressivos que pareciam sorrir de malícia, lábios vermelhos e carnosos e seios empinados, nem grandes e nem pequenos, desses que cabem em uma taça de champanhe. Tinha l,65 metro de charme e veneno, pernas bem torneadas e pés pequenos e delicados. Sua beleza, porém, não combinava com sua moral. Não hesitaria em destruir quem quer que fosse, se isso lhe trouxesse a mínima vantagem.
Muitas vezes, só em lembrar o embaraço, o desespero e a confusão de Jorge, quando em sua presença, Rosa excitava-se de tal forma que chegava a atingir o orgasmo, sem precisar se masturbar. Sentia-se como que possuída por um homem ideal, com o máximo requinte do sexo. Como se fosse apertada, tocada, lambida, penetrada com fúria até o fundo do útero. E então gozava. Gozava farta e copiosamente, como jamais homem algum a fizera gozar.
Gostaria que Marrom estivesse em liberdade, para avaliar o quanto ela progredira. Quando veio de Minas para Campinas, fugindo dos pais, ou melhor, da vergonha de estar esperando um filho ilegítimo, numa época em que isso era considerado muito pior do que a prostituição, Rosa era uma criança. Contava, então, com catorze anos. Sequer havia ainda largado das bonecas.
Encantara-se por Juvenal, inquilino de seu pai, que a iniciou na prática do sexo. Tudo começou com uma troca de olhares, que evoluiu para fortuitas bolinações, até chegar no finalmente. Lembrava-se, deliciada, da tarde em que perdeu a virgindade. A primeira transa nunca se esquece.
Ambos passaram a fazer sexo com regularidade. Até que um dia a menstruação de Rosa atrasou. Comprou um kit, na farmácia, para saber se estava ou não grávida. Deu positivo. Juvenal desconversou, quando ela lhe deu a notícia. Mais tarde, Rosa ficou sabendo que ele era casado e tinha três filhos.
Quando a barriga começou a crescer, resolveu fugir de casa. Nem lhe passou pela cabeça como faria para se sustentar, ela que não tinha profissão alguma. Escolheu Campinas por acaso e, sem dinheiro para prosseguir até São Paulo, para onde planejara ir, ficou por aqui mesmo.
Perambulando pelas ruas da cidade, suja, maltrapilha e faminta, e ainda por cima grávida, precisou esmolar para comer. Depois que teve a criança, que nunca chegou a ver e pela qual nutria um ódio irracional, conseguiu se colocar como doméstica na casa de uma respeitável família no bairro Guanabara, proximidades da estação rodoviária.
Todavia, sua ineficiência e falta de vontade de trabalhar, fizeram que durasse pouco no emprego. Um dia, perambulando pelo Mercadão, foi abordada por Marrom. Começava ali um novo capítulo em sua vida. Estava dando, naquele momento, mais um passo no sentido da completa degradação.
Marrom era um mulato espigado, de cerca de 30 anos de idade, ladrão e gigolô. Sua principal fonte de sustento era algumas prostitutas que “protegia”. Seu olho clínico viu em Rosa uma mina de ouro. A moça havia amadurecido fisicamente, após o parto. Transformara-se numa belíssima mulher. Certamente, se treinada e preparada adequadamente, não faria feio como modelo.
O marginal conduziu-a a um sobrado nos arredores, numa rua lateral, próxima do Mercadão. Lá havia mais quatro mulheres que viviam da prostituição. Nenhuma delas, porém, chegava aos pés de Rosa. Vestiam-se com desleixo e abusavam da maquiagem, para disfarçar rugas precoces.
A partir daí, a moça transformou-se numa propriedade do marginal. Era como se fosse seu relógio, seu isqueiro ou o seu anel. É verdade que tinha três refeições diárias, um lugar para morar e dinheiro para comprar roupas melhores. Não se trajava como prostituta. Vestia-se com muito bom-gosto, o que realçava a sua beleza.
Marrom lhe destinava um terço do que ganhava, recebendo até quinze homens por dia. Estava contente com o que tinha, mas de vez em quando lamentava a perda da dignidade, do amor-próprio, da independência. Nessas ocasiões, raras por sinal, concluía que esse tipo de vida não valia a pena e fazia projetos para mudar. Mas como?
Depois que Marrom foi preso e condenado a quinze anos de prisão, por uma série de furtos que tinha cometido, Rosa resolveu trabalhar por conta. Conseguiu emprego de arrumadeira numa pensão da Avenida Andrade Neves e, nas horas de folga (e até mesmo nas de serviço), suplementava a renda, dormindo com os hóspedes. Mas agia de forma discreta, para não ser descoberta.
Toda a vez que podia, furtava objetos de valor, dinheiro, roupas e até mesmo documentos, que devolvia aos donos, afirmando que os achara na rua, recebendo, não raro, significativas gratificações de seus donos agradecidos. Nunca ninguém desconfiou do golpe.
A miséria e a exploração tornaram-na degradada, cínica, sem sentimentos, sem compaixão ou qualquer espécie de escrúpulo. Fazia qualquer coisa por dinheiro e não tinha consideração por ninguém, nem por ela própria. Vendera a alma ao demônio.
Certa ocasião, por um bom pagamento, aceitou se submeter a uma curra, numa república de estudantes, mantendo relações sexuais com doze pessoas numa só noite. Isso era fichinha para ela. E apesar de fazer do sexo uma fonte de renda, gostava de ser possuída.
A “mina de ouro” que agora tinha em mente se chamava Jorge Smith. É certo que tinha um obstáculo imenso, aparentemente intransponível, a superar. Ou seja, os severos e puritanos pais do rapaz, evangélicos que, certamente, fariam de tudo para impedir esse relacionamento. Mas Rosa confiava em seu talento inato de atriz e, sobretudo, na irrefletida paixão do meu ingênuo amigo, que não tinha a mínima noção de estar lidando com a menina-veneno, na acepção da palavra, para dar seu golpe do baú.
(*) Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com
Menina-veneno, por Pedro J. Bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk (*)
Rosa achava Jorge um cretino. Para ela, o rapaz não passava de um bobo alegre, que não sabia usufruir os benefícios que sua condição financeira lhe permitia gozar. “Por que será que neste mundo só tem asas quem não sabe voar?” – se perguntava, sempre que pensava no rapaz.
Não negava que se sentia atraída sexualmente por ele, mas não tinha nenhuma esperança de que fosse correspondida. Considerava-o um molenga, um maricas, talvez fosse até mesmo veado. Mas era, sobretudo, um mimado, um filhinho de papai, que nada conhecia da vida e de suas rudezas, cercado que estava pela saia protetora da mamãe.
Achava que Jorge não entendia nada, e nem poderia entender, sobre as pessoas que o rodeavam, com suas ambições e desejos, quase nunca honestos e justos. Sabia que era notada, adorada, cobiçada, venerada até pelo rapaz, mas se tornava, de caso pensado, difícil, até mesmo inacessível e sentia enorme prazer em ser assediada e poder recusar o assédio.
Justo ela, que sempre oferecera aos homens o seu corpo, muito bem torneado e apetitoso, não raro em troca de um simples sanduíche de mortadela. Quantas vezes fizera sexo em plena rua, de pé, encostada num poste, como uma cadela. Gostava que a chamassem desse jeito.
Rosa estava decidida a prolongar ao máximo esse jogo de sedução, que tamanha satisfação lhe causava. Tratava-se de uma mulher de beleza acima da média. Era morena, cabelos longos e sedosos, pele delicada, olhos verdes e expressivos que pareciam sorrir de malícia, lábios vermelhos e carnosos e seios empinados, nem grandes e nem pequenos, desses que cabem em uma taça de champanhe. Tinha l,65 metro de charme e veneno, pernas bem torneadas e pés pequenos e delicados. Sua beleza, porém, não combinava com sua moral. Não hesitaria em destruir quem quer que fosse, se isso lhe trouxesse a mínima vantagem.
Muitas vezes, só em lembrar o embaraço, o desespero e a confusão de Jorge, quando em sua presença, Rosa excitava-se de tal forma que chegava a atingir o orgasmo, sem precisar se masturbar. Sentia-se como que possuída por um homem ideal, com o máximo requinte do sexo. Como se fosse apertada, tocada, lambida, penetrada com fúria até o fundo do útero. E então gozava. Gozava farta e copiosamente, como jamais homem algum a fizera gozar.
Gostaria que Marrom estivesse em liberdade, para avaliar o quanto ela progredira. Quando veio de Minas para Campinas, fugindo dos pais, ou melhor, da vergonha de estar esperando um filho ilegítimo, numa época em que isso era considerado muito pior do que a prostituição, Rosa era uma criança. Contava, então, com catorze anos. Sequer havia ainda largado das bonecas.
Encantara-se por Juvenal, inquilino de seu pai, que a iniciou na prática do sexo. Tudo começou com uma troca de olhares, que evoluiu para fortuitas bolinações, até chegar no finalmente. Lembrava-se, deliciada, da tarde em que perdeu a virgindade. A primeira transa nunca se esquece.
Ambos passaram a fazer sexo com regularidade. Até que um dia a menstruação de Rosa atrasou. Comprou um kit, na farmácia, para saber se estava ou não grávida. Deu positivo. Juvenal desconversou, quando ela lhe deu a notícia. Mais tarde, Rosa ficou sabendo que ele era casado e tinha três filhos.
Quando a barriga começou a crescer, resolveu fugir de casa. Nem lhe passou pela cabeça como faria para se sustentar, ela que não tinha profissão alguma. Escolheu Campinas por acaso e, sem dinheiro para prosseguir até São Paulo, para onde planejara ir, ficou por aqui mesmo.
Perambulando pelas ruas da cidade, suja, maltrapilha e faminta, e ainda por cima grávida, precisou esmolar para comer. Depois que teve a criança, que nunca chegou a ver e pela qual nutria um ódio irracional, conseguiu se colocar como doméstica na casa de uma respeitável família no bairro Guanabara, proximidades da estação rodoviária.
Todavia, sua ineficiência e falta de vontade de trabalhar, fizeram que durasse pouco no emprego. Um dia, perambulando pelo Mercadão, foi abordada por Marrom. Começava ali um novo capítulo em sua vida. Estava dando, naquele momento, mais um passo no sentido da completa degradação.
Marrom era um mulato espigado, de cerca de 30 anos de idade, ladrão e gigolô. Sua principal fonte de sustento era algumas prostitutas que “protegia”. Seu olho clínico viu em Rosa uma mina de ouro. A moça havia amadurecido fisicamente, após o parto. Transformara-se numa belíssima mulher. Certamente, se treinada e preparada adequadamente, não faria feio como modelo.
O marginal conduziu-a a um sobrado nos arredores, numa rua lateral, próxima do Mercadão. Lá havia mais quatro mulheres que viviam da prostituição. Nenhuma delas, porém, chegava aos pés de Rosa. Vestiam-se com desleixo e abusavam da maquiagem, para disfarçar rugas precoces.
A partir daí, a moça transformou-se numa propriedade do marginal. Era como se fosse seu relógio, seu isqueiro ou o seu anel. É verdade que tinha três refeições diárias, um lugar para morar e dinheiro para comprar roupas melhores. Não se trajava como prostituta. Vestia-se com muito bom-gosto, o que realçava a sua beleza.
Marrom lhe destinava um terço do que ganhava, recebendo até quinze homens por dia. Estava contente com o que tinha, mas de vez em quando lamentava a perda da dignidade, do amor-próprio, da independência. Nessas ocasiões, raras por sinal, concluía que esse tipo de vida não valia a pena e fazia projetos para mudar. Mas como?
Depois que Marrom foi preso e condenado a quinze anos de prisão, por uma série de furtos que tinha cometido, Rosa resolveu trabalhar por conta. Conseguiu emprego de arrumadeira numa pensão da Avenida Andrade Neves e, nas horas de folga (e até mesmo nas de serviço), suplementava a renda, dormindo com os hóspedes. Mas agia de forma discreta, para não ser descoberta.
Toda a vez que podia, furtava objetos de valor, dinheiro, roupas e até mesmo documentos, que devolvia aos donos, afirmando que os achara na rua, recebendo, não raro, significativas gratificações de seus donos agradecidos. Nunca ninguém desconfiou do golpe.
A miséria e a exploração tornaram-na degradada, cínica, sem sentimentos, sem compaixão ou qualquer espécie de escrúpulo. Fazia qualquer coisa por dinheiro e não tinha consideração por ninguém, nem por ela própria. Vendera a alma ao demônio.
Certa ocasião, por um bom pagamento, aceitou se submeter a uma curra, numa república de estudantes, mantendo relações sexuais com doze pessoas numa só noite. Isso era fichinha para ela. E apesar de fazer do sexo uma fonte de renda, gostava de ser possuída.
A “mina de ouro” que agora tinha em mente se chamava Jorge Smith. É certo que tinha um obstáculo imenso, aparentemente intransponível, a superar. Ou seja, os severos e puritanos pais do rapaz, evangélicos que, certamente, fariam de tudo para impedir esse relacionamento. Mas Rosa confiava em seu talento inato de atriz e, sobretudo, na irrefletida paixão do meu ingênuo amigo, que não tinha a mínima noção de estar lidando com a menina-veneno, na acepção da palavra, para dar seu golpe do baú.
(*) Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com
Rosa achava Jorge um cretino. Para ela, o rapaz não passava de um bobo alegre, que não sabia usufruir os benefícios que sua condição financeira lhe permitia gozar. “Por que será que neste mundo só tem asas quem não sabe voar?” – se perguntava, sempre que pensava no rapaz.
Não negava que se sentia atraída sexualmente por ele, mas não tinha nenhuma esperança de que fosse correspondida. Considerava-o um molenga, um maricas, talvez fosse até mesmo veado. Mas era, sobretudo, um mimado, um filhinho de papai, que nada conhecia da vida e de suas rudezas, cercado que estava pela saia protetora da mamãe.
Achava que Jorge não entendia nada, e nem poderia entender, sobre as pessoas que o rodeavam, com suas ambições e desejos, quase nunca honestos e justos. Sabia que era notada, adorada, cobiçada, venerada até pelo rapaz, mas se tornava, de caso pensado, difícil, até mesmo inacessível e sentia enorme prazer em ser assediada e poder recusar o assédio.
Justo ela, que sempre oferecera aos homens o seu corpo, muito bem torneado e apetitoso, não raro em troca de um simples sanduíche de mortadela. Quantas vezes fizera sexo em plena rua, de pé, encostada num poste, como uma cadela. Gostava que a chamassem desse jeito.
Rosa estava decidida a prolongar ao máximo esse jogo de sedução, que tamanha satisfação lhe causava. Tratava-se de uma mulher de beleza acima da média. Era morena, cabelos longos e sedosos, pele delicada, olhos verdes e expressivos que pareciam sorrir de malícia, lábios vermelhos e carnosos e seios empinados, nem grandes e nem pequenos, desses que cabem em uma taça de champanhe. Tinha l,65 metro de charme e veneno, pernas bem torneadas e pés pequenos e delicados. Sua beleza, porém, não combinava com sua moral. Não hesitaria em destruir quem quer que fosse, se isso lhe trouxesse a mínima vantagem.
Muitas vezes, só em lembrar o embaraço, o desespero e a confusão de Jorge, quando em sua presença, Rosa excitava-se de tal forma que chegava a atingir o orgasmo, sem precisar se masturbar. Sentia-se como que possuída por um homem ideal, com o máximo requinte do sexo. Como se fosse apertada, tocada, lambida, penetrada com fúria até o fundo do útero. E então gozava. Gozava farta e copiosamente, como jamais homem algum a fizera gozar.
Gostaria que Marrom estivesse em liberdade, para avaliar o quanto ela progredira. Quando veio de Minas para Campinas, fugindo dos pais, ou melhor, da vergonha de estar esperando um filho ilegítimo, numa época em que isso era considerado muito pior do que a prostituição, Rosa era uma criança. Contava, então, com catorze anos. Sequer havia ainda largado das bonecas.
Encantara-se por Juvenal, inquilino de seu pai, que a iniciou na prática do sexo. Tudo começou com uma troca de olhares, que evoluiu para fortuitas bolinações, até chegar no finalmente. Lembrava-se, deliciada, da tarde em que perdeu a virgindade. A primeira transa nunca se esquece.
Ambos passaram a fazer sexo com regularidade. Até que um dia a menstruação de Rosa atrasou. Comprou um kit, na farmácia, para saber se estava ou não grávida. Deu positivo. Juvenal desconversou, quando ela lhe deu a notícia. Mais tarde, Rosa ficou sabendo que ele era casado e tinha três filhos.
Quando a barriga começou a crescer, resolveu fugir de casa. Nem lhe passou pela cabeça como faria para se sustentar, ela que não tinha profissão alguma. Escolheu Campinas por acaso e, sem dinheiro para prosseguir até São Paulo, para onde planejara ir, ficou por aqui mesmo.
Perambulando pelas ruas da cidade, suja, maltrapilha e faminta, e ainda por cima grávida, precisou esmolar para comer. Depois que teve a criança, que nunca chegou a ver e pela qual nutria um ódio irracional, conseguiu se colocar como doméstica na casa de uma respeitável família no bairro Guanabara, proximidades da estação rodoviária.
Todavia, sua ineficiência e falta de vontade de trabalhar, fizeram que durasse pouco no emprego. Um dia, perambulando pelo Mercadão, foi abordada por Marrom. Começava ali um novo capítulo em sua vida. Estava dando, naquele momento, mais um passo no sentido da completa degradação.
Marrom era um mulato espigado, de cerca de 30 anos de idade, ladrão e gigolô. Sua principal fonte de sustento era algumas prostitutas que “protegia”. Seu olho clínico viu em Rosa uma mina de ouro. A moça havia amadurecido fisicamente, após o parto. Transformara-se numa belíssima mulher. Certamente, se treinada e preparada adequadamente, não faria feio como modelo.
O marginal conduziu-a a um sobrado nos arredores, numa rua lateral, próxima do Mercadão. Lá havia mais quatro mulheres que viviam da prostituição. Nenhuma delas, porém, chegava aos pés de Rosa. Vestiam-se com desleixo e abusavam da maquiagem, para disfarçar rugas precoces.
A partir daí, a moça transformou-se numa propriedade do marginal. Era como se fosse seu relógio, seu isqueiro ou o seu anel. É verdade que tinha três refeições diárias, um lugar para morar e dinheiro para comprar roupas melhores. Não se trajava como prostituta. Vestia-se com muito bom-gosto, o que realçava a sua beleza.
Marrom lhe destinava um terço do que ganhava, recebendo até quinze homens por dia. Estava contente com o que tinha, mas de vez em quando lamentava a perda da dignidade, do amor-próprio, da independência. Nessas ocasiões, raras por sinal, concluía que esse tipo de vida não valia a pena e fazia projetos para mudar. Mas como?
Depois que Marrom foi preso e condenado a quinze anos de prisão, por uma série de furtos que tinha cometido, Rosa resolveu trabalhar por conta. Conseguiu emprego de arrumadeira numa pensão da Avenida Andrade Neves e, nas horas de folga (e até mesmo nas de serviço), suplementava a renda, dormindo com os hóspedes. Mas agia de forma discreta, para não ser descoberta.
Toda a vez que podia, furtava objetos de valor, dinheiro, roupas e até mesmo documentos, que devolvia aos donos, afirmando que os achara na rua, recebendo, não raro, significativas gratificações de seus donos agradecidos. Nunca ninguém desconfiou do golpe.
A miséria e a exploração tornaram-na degradada, cínica, sem sentimentos, sem compaixão ou qualquer espécie de escrúpulo. Fazia qualquer coisa por dinheiro e não tinha consideração por ninguém, nem por ela própria. Vendera a alma ao demônio.
Certa ocasião, por um bom pagamento, aceitou se submeter a uma curra, numa república de estudantes, mantendo relações sexuais com doze pessoas numa só noite. Isso era fichinha para ela. E apesar de fazer do sexo uma fonte de renda, gostava de ser possuída.
A “mina de ouro” que agora tinha em mente se chamava Jorge Smith. É certo que tinha um obstáculo imenso, aparentemente intransponível, a superar. Ou seja, os severos e puritanos pais do rapaz, evangélicos que, certamente, fariam de tudo para impedir esse relacionamento. Mas Rosa confiava em seu talento inato de atriz e, sobretudo, na irrefletida paixão do meu ingênuo amigo, que não tinha a mínima noção de estar lidando com a menina-veneno, na acepção da palavra, para dar seu golpe do baú.
(*) Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com
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